RBAC 100: A Revolução na Regulamentação de Drones no Brasil Está Próxima
O mercado de drones no Brasil está prestes a passar por sua transformação mais significativa até hoje. A Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) apresentou a proposta do novo Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC 100), uma legislação moderna e arrojada que promete substituir o atual RBAC-E nº 94. Anunciada durante a feira DroneShow Robotics em São Paulo, a nova norma sinaliza uma mudança de paradigma: saímos de uma regulamentação baseada no peso do equipamento para um modelo focado na análise de risco da operação.
Esta mudança não é apenas uma atualização burocrática; é um passo estratégico para alinhar o Brasil com as práticas mais avançadas do mundo, impulsionar a profissionalização do setor e destravar o potencial de operações complexas, como voos BVLOS (Além da Linha de Visada Visual), entregas urbanas e pulverização com múltiplos drones. Para os profissionais e empresas que atuam com drones, entender o RBAC 100 não é uma opção, mas uma necessidade para se manterem competitivos e seguros.
Embora o texto final ainda dependa da análise das sugestões coletadas na consulta pública, encerrada em julho, as diretrizes apresentadas já nos dão um roteiro claro do futuro. Neste artigo completo, vamos mergulhar fundo em cada detalhe do RBAC 100, explicando o que muda, por que muda e como você, operador de drone, pode se preparar para esta nova era.
Para quem deseja se aprofundar ainda mais, a ANAC realizou uma live detalhada sobre o tema. Assista ao vídeo na íntegra para ouvir diretamente dos especialistas da agência:
O Cenário Atual: Uma Breve Análise do RBAC 94
Para compreendermos a magnitude da mudança proposta pelo RBAC 100, é fundamental olharmos para a regulamentação vigente, o RBAC-E nº 94. Em vigor desde 2017, ele foi um marco importante, criando as primeiras regras claras para a operação de aeronaves não tripuladas no país e dividindo as responsabilidades entre ANAC, DECEA e ANATEL.
O pilar central do RBAC 94 é a classificação dos drones com base em seu Peso Máximo de Decolagem (PMD):
- Classe 3: Drones com PMD de 250g até 25kg. A grande maioria dos drones comerciais (Mavic 3, Phantom 4, Matrice 200/300) se enquadra aqui. As regras são mais brandas, exigindo cadastro no SISANT, seguro RETA para operações comerciais e respeito às regras do espaço aéreo do DECEA.
- Classe 2: Drones com PMD de 25kg até 150kg. Aqui se enquadram muitos drones agrícolas de grande porte. As exigências são maiores, incluindo a necessidade de um Certificado de Aeronavegabilidade Experimental (CAE) e um processo mais rigoroso de autorização de projeto na ANAC.
- Classe 1: Drones com PMD acima de 150kg. São equipamentos de grande porte, tratados de forma muito similar a aeronaves tripuladas, exigindo certificação completa do projeto, da fabricação e do operador.
Apesar de sua importância, o modelo baseado em peso possui limitações claras que se tornaram mais evidentes com a evolução da tecnologia e das aplicações. Um drone de 1kg voando sobre uma multidão em um centro urbano apresenta um risco muito maior do que um drone de 30kg pulverizando uma área rural desabitada. No entanto, sob a ótica do RBAC 94, o segundo drone enfrenta uma carga regulatória muito mais pesada. Essa rigidez dificulta a análise de cenários operacionais específicos e, muitas vezes, impede o avanço de operações inovadoras que, apesar de complexas, podem ser conduzidas com segurança.
A Nova Filosofia: Classificação por Risco Operacional
O coração do RBAC 100 é a substituição da classificação por peso pela classificação por risco. Essa abordagem, alinhada com as melhores práticas internacionais, como as da EASA (Agência Europeia para a Segurança da Aviação), reconhece que o perigo de uma operação de drone não vem apenas do seu tamanho, mas de uma combinação de fatores: onde ele voa, como ele voa e o que acontece se algo der errado.
Emerson Granemann, mediador da live da ANAC e uma voz influente no setor, destacou o potencial dessa mudança: “A ANAC terá um papel importantíssimo e desafiante de criar condições para auditar os requerentes que demonstrarem atender as mitigações para redução dos riscos para voar sobre pessoas não anuentes ou até para a possibilidade futura de voos com enxames de drones na pulverização. A nova divisão das categorias – Aberta, Específica e Certificada – é muito interessante, pois será baseada nas análises de cenários dos diferentes tipos de operações”.
Essa nova filosofia se materializa em quatro pilares principais na proposta do RBAC 100.
1. Metodologia SORA: A Ferramenta para Avaliar Riscos
Para operações de risco moderado, o RBAC 100 introduz uma ferramenta poderosa e já consolidada internacionalmente: a SORA (Specific Operations Risk Assessment). Desenvolvida pelo JARUS (Joint Authorities for Rulemaking on Unmanned Systems), um grupo de especialistas de autoridades de aviação de todo o mundo, a SORA é uma metodologia passo a passo para avaliar os riscos de uma operação de drone e definir as mitigações necessárias para torná-la segura.
Como funciona a SORA?
A SORA não oferece um simples “sim” ou “não”. Ela guia o operador através de um processo analítico para entender os perigos intrínsecos de sua missão. Os conceitos centrais são:
- Ground Risk Class (GRC – Classe de Risco no Solo): Avalia o risco de o drone atingir pessoas ou infraestruturas críticas no solo. Fatores como a densidade populacional da área de voo (rural, residencial, urbana, industrial), a energia cinética do drone e a presença de barreiras de proteção são considerados para determinar um GRC de 1 a 10.
- Air Risk Class (ARC – Classe de Risco no Ar): Avalia o risco de colisão com outras aeronaves (tripuladas ou não). Fatores como a altitude do voo, a proximidade de aeroportos e o tipo de espaço aéreo (controlado ou não) determinam a classe de risco aéreo.
Com base no GRC e no ARC, a metodologia determina um nível de robustez necessário para a operação, conhecido como SAIL (Specific Assurance and Integrity Level), que vai de I a VI. Quanto maior o SAIL, mais rigorosas são as mitigações exigidas, que podem incluir desde procedimentos operacionais mais estritos, treinamento avançado de pilotos, até a necessidade de drones com sistemas de segurança certificados (como paraquedas de emergência) e redundância de componentes.
Dominar a SORA será uma nova e essencial competência para os operadores profissionais, permitindo-lhes justificar e obter autorização para voos que hoje são impensáveis.
2. COE: O Cadastro de Operador de Categoria Específica
Outra grande novidade é a criação do COE (Cadastro de Operador de Categoria Específica). Esse cadastro funcionará como uma espécie de licença para a empresa ou operador que deseja realizar voos de risco moderado. Para obtê-lo, não basta apenas registrar o drone; o operador precisará demonstrar à ANAC que possui a maturidade e a estrutura necessárias para gerenciar operações complexas com segurança.
Isso inclui comprovar:
- Capacidade Técnica: Pilotos com treinamento adequado e conhecimento profundo das regras e dos equipamentos.
- Estrutura Organizacional: Definição de responsabilidades, como um gerente de segurança operacional e um piloto-chefe.
- Manuais e Procedimentos: Um manual de operações que descreva todos os procedimentos da empresa, desde a manutenção dos drones até os checklists de voo e os planos de emergência.
- Análise de Risco: A apresentação de uma análise de risco bem fundamentada para a operação pretendida, geralmente utilizando a metodologia SORA.
O COE representa um salto na profissionalização do mercado. Ele eleva a barra de qualidade e segurança, separando os operadores profissionais preparados para missões críticas dos amadores ou daqueles que não investem em processos robustos.
3. Regras Claras para Drones Sub-250g
A proposta do RBAC 100 também traz regras específicas e mais flexíveis para drones com menos de 250 gramas. Reconhecendo o baixíssimo risco que esses pequenos equipamentos representam, a regulamentação deve permitir maior liberdade para seu uso, tanto recreativo quanto profissional, potencialmente eliminando a necessidade de registro em alguns cenários e facilitando operações sobre pessoas, desde que conduzidas com segurança. Isso é uma excelente notícia para criadores de conteúdo, corretores imobiliários e pequenos negócios que utilizam drones como o DJI Mini.
4. As Três Novas Categorias Operacionais: Aberta, Específica e Certificada
A estrutura do RBAC 100 organiza todas as operações de drones em três categorias distintas, cada uma com um conjunto de regras e exigências proporcionais ao seu nível de risco. Em todos os casos, o drone deve estar registrado no SISANT, o sistema oficial da ANAC.
Vamos detalhar cada uma delas.
Categoria Aberta: Operações de Baixo Risco
Esta é a categoria de entrada, projetada para as operações mais comuns e seguras. É aqui que a maioria dos hobbystas e muitos profissionais que realizam trabalhos em áreas controladas e de baixa complexidade se encontrarão.
- A quem se aplica: Voos recreativos, fotografia e filmagem em áreas rurais ou locais com baixa densidade de pessoas, mapeamento de pequenas propriedades longe de áreas urbanas.
- Principais Requisitos:
- Peso máximo de decolagem de até 25 kg.
- Operação sempre em VLOS (Linha de Visada Visual) ou EVLOS (Linha de Visada Visual Estendida, com auxílio de observadores).
- Altura máxima de voo de 120 metros (400 pés) acima do nível do solo.
- Proibição de voar sobre pessoas não envolvidas e não anuentes com a operação.
- Respeito total às zonas de exclusão e áreas de controle de tráfego aéreo definidas pelo DECEA.
- Nível de Autorização: Não requer autorização prévia da ANAC por operação, desde que todas as regras da categoria sejam seguidas. A responsabilidade é inteiramente do piloto remoto.
Categoria Específica: Operações de Risco Moderado
Esta categoria é o coração do mercado profissional de drones. Ela foi criada para acomodar operações que não se enquadram na Categoria Aberta por excederem algum de seus limites (ex: voar sobre pessoas, voar em BVLOS, etc.), mas cujos riscos podem ser mitigados através de planejamento e procedimentos adequados.
- A quem se aplica: Inspeções de infraestrutura (linhas de energia, turbinas eólicas), mapeamento urbano, pulverização agrícola, filmagens cinematográficas complexas, entregas em áreas controladas, shows de luzes com drones.
- Principais Requisitos:
- Apresentação de uma avaliação de risco operacional à ANAC, preferencialmente via metodologia SORA.
- Obtenção do Cadastro de Operador na Categoria Específica (COE) para a maioria das operações, comprovando maturidade operacional.
- Implementação de medidas de mitigação compatíveis com os riscos identificados (ex: uso de paraquedas, treinamento avançado, procedimentos de emergência).
Cenários Padrão (Standard Scenarios – STS)
Para simplificar a vida dos operadores, a ANAC planeja criar “Cenários Padrão”. Estes são, essencialmente, modelos de operação pré-aprovados pela agência. Se uma operação se encaixa perfeitamente em um cenário padrão, o operador não precisa conduzir uma análise SORA completa, bastando declarar conformidade com os requisitos do STS e obter a autorização de forma muito mais ágil. Inicialmente, a ANAC já propôs dois cenários:
- Uso Aeroagrícola: Focado em operações de pulverização, definindo requisitos específicos de altura, distância de segurança e qualificação para mitigar riscos como a deriva de defensivos.
- Segurança Pública e Órgãos de Estado: Regras customizadas para operações de polícia, bombeiros e defesa civil, que muitas vezes precisam operar em condições emergenciais e fora dos padrões convencionais.
A expectativa é que novos cenários padrão sejam criados com o tempo, cobrindo outras atividades recorrentes como inspeção de linhas de transmissão e mapeamento de corredores.
Categoria Certificada: Operações de Alto Risco
Esta é a categoria para as operações mais complexas e de maior risco, onde o nível de segurança exigido é comparável ao da aviação tripulada. São operações que extrapolam os limites da análise SORA e exigem um rigor regulatório máximo.
- A quem se aplica: Transporte de passageiros (táxi-aéreo com drones, ou eVTOLs), transporte de cargas pesadas ou perigosas em áreas densamente povoadas, operações BVLOS em espaço aéreo controlado e integrado ao tráfego aéreo convencional.
- Principais Requisitos:
- Certificação de Tipo da Aeronave: O projeto do drone precisa ser certificado pela ANAC, um processo longo e custoso.
- Certificado de Operador Aéreo (COA): A empresa operadora precisa ser certificada de forma similar a uma companhia aérea.
- Licença para o Piloto Remoto: O piloto precisa de uma licença específica, com requisitos de treinamento e horas de voo muito superiores.
- Seguro Obrigatório: Contratação de seguro robusto para cobrir danos a terceiros.
A Categoria Certificada abre as portas para o futuro da mobilidade aérea urbana e da logística, estabelecendo as bases para que essas tecnologias possam operar de forma segura e integrada à sociedade.
Tabela Comparativa: RBAC 94 vs. RBAC 100
Para visualizar as mudanças de forma clara, preparamos uma tabela que resume as principais diferenças entre a regulamentação atual e a nova proposta.
Característica | RBAC 94 (Atual) | RBAC 100 (Proposta) | Impacto para o Operador |
---|---|---|---|
Princípio Guia | Peso Máximo de Decolagem (PMD) | Risco Operacional | Foco na segurança real da operação, não apenas nas características do equipamento. |
Categorias | Classe 1, 2 e 3 (baseado no peso) | Aberta, Específica e Certificada (baseado no risco) | Maior flexibilidade e proporcionalidade nas exigências, permitindo operações complexas com as devidas mitigações. |
Operações BVLOS | Altamente restrito, exigindo autorizações complexas e caso a caso. | Possível nas Categorias Específica e Certificada através da análise de risco (SORA) e mitigações. | Abre um vasto mercado para inspeções de longa distância, monitoramento e logística. |
Voos sobre Pessoas | Geralmente proibido, com poucas exceções para pessoas anuentes. | Permitido na Categoria Específica com análise de risco e mitigações de segurança aprovadas. | Viabiliza uma gama de serviços em áreas urbanas, como inspeções de fachadas e filmagens de eventos. |
Processo de Autorização | Baseado no cadastro do drone (SISANT) e autorizações de voo (DECEA). | Introduz a Análise de Risco (SORA), o Cadastro de Operador (COE) e os Cenários Padrão (STS). | Exige maior conhecimento técnico e maturidade operacional, mas cria caminhos claros para autorizações complexas. |
Como se Preparar para a Transição?
O RBAC 100 ainda não tem data para entrar em vigor. Após a análise das contribuições da consulta pública, a ANAC irá publicar o texto final e, provavelmente, estabelecerá um período de transição para que o mercado se adapte. No entanto, a direção está clara, e os operadores inteligentes devem começar a se preparar agora.
- Estude a Metodologia SORA: Este será o novo idioma da segurança operacional. Comece a pesquisar sobre GRC, ARC, SAIL e os processos de mitigação. Entender essa lógica lhe dará uma enorme vantagem competitiva.
- Profissionalize sua Operação: Comece a pensar como um operador da Categoria Específica. Desenvolva seu próprio manual de operações, crie checklists para cada tipo de missão, estabeleça um programa de manutenção para seus drones e documente tudo.
- Invista em Treinamento: A nova regulamentação valorizará o conhecimento. Busque cursos que vão além do básico de pilotagem, focando em planejamento de missão, regulamentação avançada e gerenciamento de risco.
- Acompanhe as Notícias: Fique de olho nas publicações da ANAC e em portais de notícias especializados, como o blog da NW Drones, para saber em primeira mão quando o RBAC 100 for oficialmente implementado.
Um Futuro Promissor para o Setor de Drones no Brasil
A implementação do RBAC 100 será um divisor de águas. Ao adotar uma abordagem moderna e baseada em risco, o Brasil se posiciona na vanguarda da regulamentação de drones, criando um ambiente de negócios mais seguro, profissional e inovador. A nova norma trará mais clareza para os operadores, segurança jurídica para os clientes e, o mais importante, abrirá caminho para que o verdadeiro potencial dos drones seja explorado em setores como agricultura de precisão, inspeção de ativos, segurança, logística e mapeamento avançado.
A jornada para a plena adoção do RBAC 100 exigirá estudo e adaptação por parte de todos os envolvidos no ecossistema de drones. Mas o destino final é um mercado mais maduro, seguro e repleto de oportunidades.
A NW Drones está comprometida em guiar você por esta transição. Entre em contato com nossos especialistas para saber como podemos ajudar sua operação a se preparar para o futuro da regulamentação de drones no Brasil e a escolher os equipamentos ideais para cada categoria operacional.